sexta-feira, 4 de outubro de 2013

As coisas que vamos aprendendo…

Exemplo de mapeamento de habitats no Canal Faial-Pico.

Ao regressar ao Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores, após uma ausência de sete anos, interrogava-me sobre qual seria a grande novidade científica que me iria abismar. Estando relativamente a par do que se passa no estudo do mar, não podia ser uma novidade bombástica, daquela que se lê nos jornais. Essa, eu saberia. Portanto, estava curioso sobre aquela novidade deliciosa e esquiva, em que ainda não teria colocados os olhos. Ansiava por aquele momento em que dissesse um ingénuo disparate e me respondessem: “Mas nós já sabemos isso!”
Não tive que esperar muito…
Há novas espécies alienígenas marinhas nos Açores publicaram, entre muitos outros, os meus amigos Ricardo Cordeiro, Sérgio Ávila, Ana Costa (de São Miguel) e António Malaquias (vive na Noruega e é casado com uma faialense), o negócio do turismo de observação de jamantas [*, **] está em crescimento, não apenas nos Açores [**], mas no mundo inteiro [*], foi encontrada uma nova fonte hidrotermal de grande profundidade nos Açores [*] e as alforrecas estão a crescer em número porque os oceanos estão mais quentes, descobriram cientistas do Mediterrâneo [*, *]. Curiosamente, segundo estes cientistas, a nossa amiga água-viva (Pelagia noctiluca) [*] é uma das grandes beneficiadas. Estas foram algumas das primeiras novidades com que me bafejaram. Tanta coisa nova…
No entanto, o que mais me impressionou foi ficar a saber que foram definidos novos e variadíssimos habitats marinhos. Ou seja, houve um colega, o meu colega de gabinete Fernando Tempera, que passou muitas horas a observar vídeos da maioria das grandes expedições científicas e conseguiu sistematizar conjuntos de espécies e relacioná-los com as principais características biofísicas (como a profundidade e o tipo de substrato). É um daqueles trabalhos que exige muito conhecimento, para conseguir identificar todas as espécies, e uma enorme paciência…
Quando olhamos para a paisagem terrestre, distinguimos facilmente florestas, pradarias, praias, entre muitas outras. O mesmo aconteceria debaixo de água se conseguíssemos ver. Este colega abraçou a missão de tentar encontrar o equivalente a estas agregações até vários quilómetros de profundidade. Os vídeos recolhidos pelos submarinos [*, *] e veículos de operação remota (ROV) [*], transportados a bordo dos enormes navios de investigação que amarram no porto da Horta [*, *], foram escalpelizados detalhadamente e os resultados surgiram.
E, no campo dos mistérios que continuam sem resposta, aqui deixo alguns dos desafios que motivam os colegas da Universidade dos Açores: para onde vão as jamantas quando saem dos Açores? Porque aparecem mortas as baleia-de-bico apenas nas duas últimas semanas de Julho? Que espécies de profundidade que habitam o Mar dosAçores têm propriedades medicinais? Onde se acumulam as grandes concentrações de metais no mar profundo? Qual é o impacto esperado da atividade de mineraçãodos mares? Como irá evoluir a invasão de Caulerpano porto da Horta? Porque há espécies [*] que vivem em abundância no Faial e Pico, mas estão totalmente ausentes das restantes ilhas dos Açores? O que acontecerá com a acidificação dos oceanos consequente às alterações climáticas? Como irão evoluir as pescarias dos Açores? São tudo boas perguntas, para as quais há hipóteses explicativas, mas ainda não há verdadeiras respostas. Essas emergirão do estudo e dedicação dos cientistas dos Açores.
Ah, que mundo lindo este que está absolutamente cheio de maravilhosas perguntas! Melhor que o mistério da nossa ignorância é a conquista de uma resposta. Uma resposta. Uma boa resposta é o que espero conquistar até ao final do ano. Quando a tiver, aqui estarei a partilhá-la!

Exemplos de facies do mar profundo dos Açores.
(imagens de EMEPC, IMAR/DOP-UAz; Greenpeace (c) Gavin Newman; SEAHMA
in: Tempera, F, JN Pereira, AB Henriques, F Porteiro, T Morato, V Matos, M Souto, B Guillaumont, RS Santos (2012). Cataloguing deep-sea biological facies of the Azores.
Revista de Investigación Marina, 19(2): 36-38)

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