sexta-feira, 26 de julho de 2013

Açores nos Açores?

A grande distância, os milhafres poderiam ter sido confundidos com açores?
Foto: F Cardigos

Desde sempre que me lembro de ouvir os nossos visitantes perguntar porque deram o nome de “Açores” a este arquipélago de nove ilhas. Uma resposta fácil é que alguém se terá enganado a identificar os milhafres e o nome pegou. Outros contrapõem que, naquela época, no século XV, seria impossível fazer uma confusão destas e, portanto, o erro na identificação não poderia ter acontecido. Para mais, os milhafres, dado o seu limitado raio de ação, teriam grandes dificuldades em chegar aos Açores. Pensando bem, é realmente estranho que não haja milhafres nas ilhas do grupo Ocidental. Ou seja, como explicar que estas aves tenham conseguido chegar do Continente Europeu até aqui e não tenham conseguido dar um salto, muito mais pequeno, até às Flores e ao Corvo. Se podemos explicar a sua inexistência no Corvo por ausência de uma superfície útil suficiente para o seu abrigo e alimentação, o mesmo não se aplica às Flores. Resumindo, os milhafres dos Açores podem ter sido introduzidos por mão humana já em tempos mais recentes.
Muitos defendem que o nome se deve à localidade de Açores, no continente, de onde alguns dos descobridores de Santa Maria teriam sido originários ou pela devoção de Gonçalo Velho Cabral a Nossa Senhora dos Açores. Uma outra corrente alternativa defende que os Açores devem o seu nome à expressão genovesa Azzurre, dado o tom azulado das ilhas. Apesar de não me agradar, até porque não vejo as ilhas em tons de azuis, esta teoria tem ganho adeptos de peso ultimamente.
Faço esta introdução para agora expor uma outra teoria que foi defendida por um amigo cientista. Segundo o Dr. Paulo Alexandre Monteiro, é possível que os Açores devam o seu nome aos… açores! É verdade! Há registos de escritos precoces assinalando exportação de açores para o Continente.
Admitindo esta hipótese como boa, então onde estão os açores dos Açores? Para onde foram? Esta, quanto a mim, é a parte mais frágil da teoria que partilho. É possível que os açores dos Açores tenham, ao longo da sua adaptação a este território, perdido a sua capacidade de fugir de predadores ou competidores, por não os terem. Assim sendo, quando os primeiros povoadores aqui chegaram, tê-los-ão apanhado em grandes quantidades e exportado para o Continente (daí os tais registos que referi atrás). Capturaram, usaram e exportaram até à extinção final. Será? Os lobos-marinhos de Santa Maria tiveram esse triste fim.
Penso que esta questão apenas ficará definitivamente resolvida quando se encontrarem registos fósseis que nos indiquem que aves de rapina existiam historicamente nos Açores, se é que alguma cá existia… É também por essa razão que vejo com enorme agrado a 9ª expedição paleontológica que decorreu na ilha de Santa Maria nos últimos dias. É pela insistência, por vezes mal compreendida, de investigadores como o Doutor Sérgio Ávila, que vamos preenchendo o fabuloso puzzle da construção biológica das nossas ilhas.
Olho para os resultados de cada expedição e fico com enorme curiosidade sobre o futuro. A extraordinária aventura do conhecimento dá-nos respostas positivamente contaminadas com mais perguntas…. Que novidades haverá este ano? A expedição já terminou e aguarda-se o estudo completo do material recolhido e dos registos efetuados para dar mais um passo em direção ao conhecimento. Quem sabe se será este ano que ficaremos a saber se alguma vez houve açores nos Açores?

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Estação Molhada

Azáfama dos preparativos para a partida da
III Travessia do Canal Faial-Pico em embarcações de materiais reutilizados.
Foto: F Cardigos

Desde que me lembro que os anos, para mim, se dividem em duas partes. Sim, eu sei que para a maioria das pessoas têm quatro (as Estações do Ano), mas eu sou mais simples e, portanto, para mim, há apenas duas: a estação seca e a estação molhada. Na estação seca há tempestades, o mar está revolto, faz frio e não podemos ir para o mar. A estação molhada é quando podemos interagir com o gigante azul!
Porque este ano o verão chegou mais tarde, a minha estação seca (alusão à “lei seca”, porque o meu vício é o mar) foi longa. Já nem sabia se sabia nadar em água salgada… Felizmente, neste final de semana, tudo mudou.
Fui convidado pela APEDA para colaborar com a organização da III grande travessia do Canal Faial-Pico em embarcações construídas em materiais reutilizados. Apesar dos poucos concorrentes, foi mais um evento coroado de sucesso. As três equipas vencedoras estiveram em bom plano, revelando imaginação, empenho e sentido ambientalista. Para mim, pessoalmente, este evento marcou o início da estação molhada. A roupa salgada e um irresponsável escaldão na cara são as provas da mudança.
No dia seguinte, graças à solidariedade de um colega e à colaboração de uma das empresas de cima do cais da Horta, que rapidamente conseguiu disponibilizar duas garrafas de mergulho, pude consumar o ato e submergir. Agora sei, os peixes continuam ao largo de Castelo Branco do Faial, como pude verificar em detalhe. Havia alguma ondulação e a correspondente suspensão, mas foi maravilhoso.
Depois de devidamente motivado pelo Sr. Mário Frayão, com quem fiz uma visita de reconhecimento prévia, ao final da tarde, corri até ao topo do Monte Carneiro e fiquei deslumbrado com a vista. Parabéns à Junta de Freguesia da Matriz e parabéns à Câmara Municipal da Horta pela intervenção. É um espaço que nos esmaga pela beleza da vista e não é beliscado, tal a simplicidade e a oportunidade da intervenção. É dos melhores miradouros em que já estive.
Agora, ao final do terceiro dia da estação molhada, estou a escrever rapidamente este artigo, até para não irritar a editora-chefe deste jornal, e a preparar o equipamento para partir em direção ao Banco D. João de Castro. Este sítio classificado como Rede Natura 2000, como Área Marinha Protegida através da Convenção OSPAR e como Reserva Natural do Parque Marinho dos Açores, caso tudo corra conforme planeado, talvez permita a nossa visita já amanhã.
O Banco D. João de Castro é o único sítio em que já tive de cancelar operações subaquáticas porque os meus colaboradores (eu não…) não se conseguiam concentrar, tal o nível de deslumbramento. Entre jamantas, cardumes infindáveis de diversas espécies de pequenos pelágicos e o vulcanismo ativo, tudo contribuiu nesse momento para pouco ou nada fazermos. Era, de facto, bom demais. Amanhã, muito limitados pelo tempo, teremos de nos abstrair do que nos rodear e efetuar os trabalhos de monitorização e recolhas que estão definidos.

E assim passa comprovadamente mais um ano. O ciclo completa-se e repete-se. O colorido é todo o inesperado que preenche o tempo e o mar, associado ao saber que se acumula, e é mais um conjunto de magníficas experiências e estórias que contaremos a quem nos quiser ouvir.