domingo, 24 de julho de 2011

Missão M@rbis 2011

Apesar dos grandes peixes ainda estarem ausentes, já é possível ver no Dollabarat meros com porte apreciável. Foto: MA Santos SIARAM.

Decorreu de 15 a 18 de Julho a segunda parte da Expedição M@rbis 2011. Neste período em especial, foi explorado o complexo das Formigas e Dollabarat. Depois da Madeira (Desertas e Porto Santo), o NTM “Creoula” deslocou-se aos Açores, onde se juntou ao NI “Arquipélago” e a diversas equipas científicas regionais e elaboraram um dos mais intensivos e extensivos programas de pesquisa científica efetuados neste fascinante recanto do nosso arquipélago. Esta missão teve a organização da Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar (EMAM) e colaboraram, na componente açoriana, o Governo dos Açores e o Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP) da Universidade dos Açores.
A Expedição M@rbis, em termos gerais, é uma ação da EMAM e tem como principal propósito a recolha de informação georreferenciada e de alta qualidade sobre a presença de espécies e habitats nas águas portuguesas. A informação recolhida é depositada numa poderosa ferramenta informática, denominada também M@rbis, e estes dados servirão para responder a questões relacionadas com o acompanhamento da delimitação da Plataforma Continental de Portugal e a monitorização da Rede Natura 2000.
O complexo das Formigas e do Dollabarat já é estudado desde há muitos anos. O primeiro registo de que tenho conhecimento sobre a biologia destas Formigas especiais é dado pelos trabalhos do Padre Gaspar Frutuoso, em pleno século XVI, referindo a presença de lobos-marinhos nos ilhéus. Depois disso, pouco foi feito até que, com o advento da Universidade dos Açores, o Departamento de Biologia (DB) e o DOP puseram as mãos ao trabalho. Neste momento, há séries temporais de mais de uma dezena de anos com estudos detalhados sobre este extraordinário complexo. Foram estas informações que conduziram à classificação deste local como Reserva Natural no âmbito do Parque Natural de Santa Maria, Zona Especial de Conservação da Rede Natura 2000, Área Marinha Protegida dentro da Convenção OSPAR e zona Ramsar realçando o papel destas águas na preservação da vida selvagem.
Tendo em conta que estes trabalhos de rastreio, inventariação e monitorização já se realizam há diversos anos, impõe-se perguntar o que trouxe a missão deste ano de novo? A resposta é tão vasta que receio ser este espaço demasiado curto para tanta informação. Tentemos.
Primeiro que tudo, a presença do Navio de Treino de Mar “Creoula”, gerido pela Marinha Portuguesa, que, com mais de noventa pessoas a bordo, estabeleceu-se como uma plataforma privilegiada que serviu de base a duas dezenas de investigadores. A partir desta embarcação, quatro equipas de mergulhadores-cientistas inventariaram detalhadamente os organismos presentes nos Ilhéus. Os resultados não demoraram a começar a surpreender. Logo na primeira amostragem foi recolhida uma nova espécie, Phyllariopsis brevipes. Para além da espécie mais comum de lamina, há agora uma segunda espécie confirmada neste local. Para além dos trabalhos subaquáticos, alguns equipamentos utilizados a partir de bordo mediram radiância, condutividade e temperatura. Estes dados permitirão tentar identificar as razões para parte da singularidade deste local em comparação com o restante arquipélago.
Pela primeira vez, uma técnica da direção regional da Cultura, especializada em arqueologia náutica, também acompanhou os trabalhos nas Formigas. Pelos registos efetuados, foi possível associar alguns dos fragmentos presentes no mar dos Ilhéus ao infortunado navio “Olympia”. Era uma questão que subsistia e que permitirá clarificar outros mistérios no futuro.
A bordo do Navio de Investigação “Arquipélago”, investigadores do DOP e do DB, para além do “simples” rastreio de espécies, recuperaram e, depois de efetuada a manutenção, recolocaram equipamentos de registo oceanográfico e realizaram mergulhos com um “lander”. Este equipamento, dotado de duas câmaras de filmar, ilustrou os fundos marinhos até 1100 metros de profundidade. Ao contrário dos ROV (Veículos marinhos de Operação Remota), que têm mobilidade, o “lander” aterra num local e filma a atividade que circula em sua volta. Desde tubarões de profundidade até enormes caranguejos, há uma nova fauna na escuridão das Formigas que agora ficou registada.
A bordo das duas embarcações, representantes da administração, pessoal da Marinha, jornalistas, estudantes de diferentes níveis, mergulhadores de segurança e escuteiros marítimos completavam o leque de interessados que ajudaram a desvendar alguns dos mistérios deste local. Vários dias passados e tenho a sensação de ter estado a trabalhar com uma verdadeira equipa de luxo!
Em termos de conservação deste local, depois de somados todos os minutos de mergulho e outras atividades efetuadas, há dois factos que ressaltam. Por um lado, a atividade de pesca ilegal diminuiu nos últimos anos, provavelmente fruto de uma incisiva ação por parte da Autoridade Marítima, mas, por outro, ainda há visíveis consequências de um passado que eu classifico de criminoso. Por exemplo, um dos mergulhadores registou um congro com um anzol na boca… Lamentável. Mais grave, as Formigas e o Dollabarat ainda não têm os peixes de grande dimensão de outros tempos. Vai levar tempo, mas tenhamos paciência, contentando-nos com os peixes-cão, bicudas, tubarões, jamantas, com os organismos coloniais que parecem autênticas árvores subaquáticas, as anémonas e as lesmas-do-mar e, em breve, voltará o esplendor das enormes algas a “esvoaçar” ao sabor das ondas e marés por entre as quais voltaremos a ver os pachorrentos meros com dezenas de quilos. Apesar de ser uma Reserva, com a autorização dos serviços competentes é possível submergir neste fantástico local. Para a recuperação do anterior esplendor, é preciso tempo, respeito e paciência, mas, se seguirmos este caminho, dentro em breve, o banco de pesca Mar da Prata e as costas de Santa Maria e São Miguel poderão estar a beneficiar dos efeitos da proximidade a uma fantástica reserva e uma das mais valiosas preciosidades do arquipélago dos Açores.

1 comentário:

  1. A frase original "Logo na primeira amostragem foi recolhida uma nova espécie de laminária" estava incorrecta porque a espécies recolhida não era uma laminária, trantando-se da espécie Phyllariopsis brevipes. Obrigado à Doutora Estibaliz Berecibar pela correcção.

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