sexta-feira, 17 de junho de 2011

Eco-Castelinho

Baleia-anã (Balaenoptera acutorostrata) a saltar fora de água.
Foto: R Prieto ImagDOP.

Um dos livros que me impressionou enquanto pré-adulto foi “O Alquimista” do Paulo Coelho. Não gosto do estilo fatalista, determinista e populista da maioria dos escritos do Paulo Coelho. Se calhar também por isso, “O Alquimista” foi uma lufada de ar fresco de um autor que nos sugeria atenção para os sinais com que somos presenteados quotidianamente. Nestes dias, a minha mulher, para minha admiração porque não é o género dela, começou a ler “O Alquimista”.
No Dia Mundial dos Oceanos estive em Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, participando numa conferência da Semana Azul do Concelho. Ao contrário do que era suposto, não me limitei a assistir, mas fui desafiado a também falar. Falar sobre mar… Era impossível resistir. Improvisei um pouco e por ali fui... A certo passo, projectei uma imagem de uma baleia-de-barbas a saltar fora de água (uma belíssima foto tirada pelo Dr. Rui Prieto) e informei que não se sabia muito bem qual a verdadeira razão que levava as baleias a saltar. Disse que havia diversas teorias, mas, não havia uma prova concreta. O certo é que o dispêndio de energia é tão elevado que implica, certamente, uma razão. São toneladas de animal que saem repentinamente para fora de água. Tem de haver uma razão. Perguntei à assistência qual era a opinião deles. De imediato, sem pestanejar um dos jovens que assistia, e que, mais tarde, soube chamar-se Hélio Medeiros, disse “estão a apanhar Sol!”. A resposta foi tão inesperada e tão pouco razoável que me fez parar e pensar que, de facto, os animais inteligentes têm uma certa propensão para fazer coisas energeticamente pouco sensatas apenas por prazer. Na minha lista de hipóteses, esta não estará na primeira linha, mas passou a constar, quanto mais não seja, pela inesperada piada.
À noite, depois de vir de São Miguel, estive no auditório do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores a ver um documentário chamado “Sea Change”. A certo passo, a cientista explicava o ciclo biológico do salmão (um saboroso peixe que não existe no Mar dos Açores). Dizia ela, “aqui podemos ver os salmões a dar saltos para fora de água e ninguém sabe explicar porque fazem isto”. Eu nem queria acreditar! Dei um salto na cadeira e disse “estão, claramente, a apanhar Sol!” Claro que me arrisquei a receber de volta um reprovador “Shhhh…” da restante audiência e fiquei envergonhadíssimo, mas, ao mesmo tempo, ri-me interiormente durante o resto do filme.
No dia seguinte, estive no Castelinho, um jardim-de-infância da Ilha do Faial. Fomos convidados a participar no hastear da bandeira-verde da eco-escola. Contextualizando, o Castelinho tem uma postura exemplar no que diz respeito a ambiente. Têm uma horta biológica, um compostor, fazem triagem de resíduos, anotam diariamente os consumos de água e luz… Enfim, tudo o que todos deveríamos fazer e que eles fazem! Uma das mães desabafava, com um certo exagero enfático espero eu, “cada vez que vou ao supermercado e trago sacos de plástico sou torturada pelos meus próprios filhos”. São uns autênticos guerrilheiros ambientais pensei eu. Precisamos deles! Por essa razão, quando convidado a discursar, resolvi fazê-lo para as crianças e com linguagem que elas percebessem. Talvez isso tenha provocado alguma indignação por parte dos adultos, mas, obviamente, se são assim interventivas ao ponto de merecerem a bandeira verde, é porque elas fazem a diferença e merecem que, naquele dia, o político presente fale para elas. Foi isso que eu pensei e assim fiz. Por outro lado, se aquelas duas centenas de crianças são assim é também porque os pais, educadores e auxiliares e administrativos da escola o propiciam e portanto são dignos da respectiva vénia e agradecimento. Aqui fica. Aliás, reforçando, uma instituição que homenageia os seus mais antigos funcionários, alguns já reformados, com a emoção que ali vi e com as boas práticas ambientais que registei é porque, mesmo sem disso ter consciência, tem o espírito de ecologia alargada que há tanto tempo se tenta imbuir na sociedade ocidental. O Castelinho dá-nos esperança num mundo melhor.
No espírito do Paulo Coelho, agora sei que, certamente, as baleias e os salmões saltam fora de água para, serem iluminadas pela luz do Sol, ou seja, para tentar ver o que eu vi naquela escola, o Eco-Castelinho! “Sicut aurora humanitates lucent”.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Ambiente Positivo!

Urze plantada por voluntários na Ilha do Corvo.

Respondendo ao desafio lançado pelo Jornal Terra Nostra, tentei identificar um ponto positivo para destacar no Ambiente dos Açores. Comecei por pensar no nosso património natural com as suas espécies endémicas, como o painho-de-Monteiro ou o priolo. Aliás, em São Miguel, ilha onde se insere este periódico, teria toda a lógica escrever sobre o priolo, esse símbolo vivo da natureza dos Açores! Esse pequeno pássaro, sobrevivente de intempéries e perseguições, é um herói que reflecte a tenacidade do ser açoriano, muito antes de os Açores estarem nomeados. Não compreender a importância e o potencial do priolo é uma irresponsabilidade, sinónimo de falta de cultura ambiental. Felizmente, são cada vez menos os que ignoram o priolo.
No entanto, sendo eu responsável pelos Assuntos do Mar, considerei que teria de deixar esse tema para quem de direito. Orientando a minha atenção para o mar e zona costeira, pensei no galardão QualityCoast, que certifica a qualidade da nossa orla costeira. Era uma boa hipótese. Mas porquê destacar o QualityCoast quando temos também as bandeiras azuis para zonas balneares e marinas? Ou a praia acessível para promover a acessibilidade a esses sítios aos cidadãos com capacidade de locomoção limitada? Ou as zonas OSPAR que estão a ajudar a estender o mar dos Açores muito para além dos limites geográficos tradicionais? E porque não escrever sobre os cetáceos dos Açores? Sim, de facto, recentemente, fomos distinguidos como um dos dez melhores locais do mundo [*, *, *, *] para observar baleias, cachalotes e golfinhos e isso é, sem dúvida, importante. Para além disso, foi no último ano que foi feita a primeira listagem de todas as espécies que existem nos Açores, incluindo no ambiente marinho. Sendo o conhecimento a pedra basilar para se poder apreciar, proteger e utilizar com sustentabilidade, esta lista compilada pelo Professor Paulo Borges é um instrumento fundamental.
Pensei em tudo isto e cheguei à conclusão que, no Dia Mundial do Ambiente, para mim, a maior mais-valia do Ambiente dos Açores são as pessoas. São as pessoas que usam a costa dos Açores, são elas que a podem proteger e enchê-la de espécies de plantas endémicas, como a magnífica Azorina, são as pessoas que podem limpar a costa que é agredida pelos depósitos de resíduos clandestinos, pelos lixos oceânicos e pelo retorno das escorrências das ribeiras. São também as pessoas que podem usufruir dos diferentes certificados de qualidade ambiental que elas próprias constroem com as boas práticas que aplicam e que transmitem aos seus filhos e amigos. São também as pessoas que se movimentam e revoltam quando as decisões da administração não são consentâneas com a riqueza e protecção do património ambiental. Serão também essas pessoas, forjadas no rigor do Inverno açoriano e na luminosidade especialmente azul e verde do seu Verão, que sabem mostrar a quem nos visita as mais de duas dezenas de cetáceos que aqui habitam. Serão também estas pessoas que mergulham nas profundezas das águas límpidas do Mar dos Açores, seja em busca de respostas científicas nas fontes hidrotermais de grande profundidade ou, em puro deleite, observando os peixes que se aglomeram em torno de um naufrágio oriundo do Dia “D”.
Em resumo: Viva o ambiente dos Açores! E, neste dia, uma homenagem sentida aos que o protegem.

Dia Mundial do Ambiente 2011


Já escrevi neste jornal e em anos anteriores sobre o Dia Mundial do Ambiente [2007]. Da última vez que o fiz, em 2010, assinalei o dia fazendo uma súmula dos diferentes certificados ambientais com que foi galardoado o nosso património. Em conjunto com o símbolo de uma das Mais Belas Baías do Mundo, que a Horta já pode ostentar, são dezenas de momentos que identificam a qualidade ambiental que nos rodeia e que reconhecem a nossa capacidade de a gerir. Obviamente, se nos vão atribuindo esses certificados, também nos colocam pressão para que mantenhamos a sua qualidade e aumentemos de forma sustentável o seu usufruto.
Em 2010, referindo-me aos dados então disponíveis, assinalei as 6500 espécies registadas. Hoje, depois da publicação do Professor Paulo Borges e colegas que sumariza este autêntico espólio, são mais de oito mil. Nesse mesmo artigo, mencionei as bandeiras azuis da Região. Hoje, são 33 zonas balneares galardoadas e 14 classificadas como praias acessíveis.
Apesar de ter sido apenas há um ano atrás, já percorremos um interessante caminho que pretende agora essencialmente valorizar e recuperar os pontos menos felizes do nosso ambiente. Por exemplo, está a ser feito um esforço elevadíssimo para recuperar a Baía da Horta em relação à invasão de uma alga verde, a Caulerpa webbiana, as estruturas para gestão de resíduos estão a ser construídas ou em fase final de projecto em todas as ilhas dos Açores e há uma luta constante contra a flora invasora terrestre. A Direcção Regional do Ambiente está a conduzir os trabalhos nestas duas últimas frentes e, ao mesmo tempo, valoriza constantemente o património existente. A extensão do Jardim Botânico do Faial é apenas o último exemplo de uma longa lista.
Na intensificação da acção para aperfeiçoamento do nosso património colectivo, o Director Regional do Ambiente, Dr. João Carlos Bettencourt, tem acompanhado no terreno as diferentes actividades do EcoFreguesias. Verifica-se que há um esforço elevado por parte das autarquias na identificação e colmatação do abandono de resíduos, aumentando, em muito, a intolerância dos cidadãos em relação às más práticas ambientais.
Mas o ambiente está longe de ser apenas as espécies, os habitats e a gestão de resíduos. Como foi recentemente anunciado, o Parque Eólico do Faial vai ser renovado e deslocalizado, aumentando em larga escala a sua capacidade. Com esta acção, ao mesmo tempo, reduzimos as emissões de Carbono para a atmosfera e reduzimos o preço a pagar pela energia que consumimos. Em época de instabilidade do preço da energia com origem fóssil, esta é uma acção que muito nos poderá beneficiar.
A diversificação agrícola, consequente à estratégia lançada pelo sector agrícola do Governo Regional, tem-se consubstanciado em linhas de crédito para os inovadores e acções de sensibilização para os profissionais ainda renitentes. Esta é uma opção de valorização da nossa qualidade neste sector produtivo e, quer-me parecer, irreversível se quisermos competir no mercado global.
Em relação ao ambiente marinho, em fase de expansão para lá da Zona Económica Exclusiva, a observação de cetáceos dos Açores atingiu um patamar de enorme reconhecimento internacional, estando entre dez dos melhores sítios do mundo, segundo uma publicação internacional e a observação de tubarões, que ainda em 2010 estava em aparecimento hesitante, está em crescimento e já com boas consequências económicas. Felizmente adivinham-se também novas actividades, como a exploração energética no alto-mar e a exploração minerológica. Saibamos nós estruturar e planear essas actividades para que os benefícios sejam sustentáveis, responsáveis e equitativos. O futuro é lançado todos os dias pelos homens e mulheres de bem, que têm visão e capacidade de acção. No fundo, todos nós!