segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

Um ano de música erudita na Ilha do Faial

Não há dúvida que este ano houve muito mais arte na Ilha do Faial que nos anos anteriores. Na minha opinião, há diversas razões para esse facto, começando pela própria preparação do ano. O trabalho feito ao nível da edilidade, no final do mandato anterior, com a exemplar organização da vereadora Sandra Costa, permitiu alicerçar alguns dos resultados observados este ano. O próprio dinamismo criado conduziu a propostas políticas eleitorais com grande ênfase na componente cultural.

Agora, já neste ano, a existência de uma enérgica vereadora a tempo inteiro para a cultura, assuntos sociais e desporto, a existência de uma biblioteca pública superiormente dirigida, um museu da Horta que continua a desempenhar o seu papel de firme mostruário da nossa cultura, uma empresa municipal que mantém o teatro faialense, o Cineclube da Horta que cimentou a sua actividade, a existência de um Conselho da Cultura e dezenas de pequenas instituições de artes e espectáculos, dá-nos razões para estarmos confiantes. No entanto, no outro prato da balança, a instabilidade directiva dos Amigos do Conservatório e o desorganizado e limitado apoio financeiro da Câmara Municipal da Horta são aspectos que nos fazem ter algum receio. Entre os prós e os contras, o saldo é francamente positivo, mas queremos mais e melhor!

Este ano, houve momentos que encheram as medidas em termos culturais. O espectáculo do Mário Laginha no Teatro Faialense, o Stabat Mater de Pergolesi, o Concerto de Vivaldi pela Horta Camerata foram alguns dos marcos da história deste ano musical. Há pequenos espectáculos, com particular destaque para a segunda actuação do concerto para piano a quatro mãos por Olga Horobetz e Marcello Guarini, que nos satisfazem completamente. Que espectáculo tivemos no Salão Nobre da Câmara Municipal! Para mim, no entanto, o ponto mais alto dos espectáculos musicais da ilha do Faial deste ano foi a apresentação do Requiem de Mozart. Baseou-se em músicos de São Miguel, contou com diversas participações faialenses e a direcção artística foi do “austríaco mais açoriano que existe”, o faialense Kurt Spanier. Aliás, curiosamente, quando o Coral de São José esteve no Faial, para cantar o Requiem de Mozart, tive oportunidade de falar com alguns dos elementos. Fiquei agradavelmente surpreendido quando me disseram que a actuação na nossa ilha seria “a prova de fogo” porque, diziam-me, “o nível cultural da Ilha do Faial é muito elevado, muito maior que em São Miguel e nos outros sítios”. Noutra ocasião, na Ilha Terceira, alguém do Grupo Foclórico dos Antigos Bailhos, do Posto Santo, dizia-me sobre os grupos do Faial: “Aquilo lá é sério. Eles bailam bem!”. É reconfortante, mas não chega.

Na minha óptica, para o futuro, deveríamos apostar ainda mais na formação. As bandas filarmónicas, os grupos de teatro, os ranchos foclóricos, e outras instituições têm, abnegadamente, feito um trabalho fundamental na preservação dos valores culturais, na dinamização do aparecimento dos novos talentos e a proporcionar-nos excelentes espectáculos. Isso é apenas possível graças ao apoio do Governo Regional e da Câmara Municipal. Ou seja, não há um único desses agrupamentos que sobreviva apenas com a quotização e outros apoios privados. É triste que não haja um empenho do nosso sector comercial e industrial para apoiar efectivamente as instituições culturais. A cultura faialense está muito dependente do poder político e isso não me parece saudável.

Por outro lado, não podemos deixar que os frágeis alicerces da cultura erudita da Ilha do Faial sofram qualquer perturbação. Isto é, precisamos de estar atentos para certificar que as anunciadas mudanças ao nível do Conservatório Regional da Horta são potenciadoras do nosso nível cultural e não apenas movimentações relacionadas com a economia de escala. Evidentemente que é importante o Estado ter uma postura adequada em relação aos seus serviços, até porque são pagos por todos nós, mas o saldo, em termos culturais, deverá também ser sempre positivo.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

DIRECTOR REGIONAL DO AMBIENTE GARANTE

Evoluir sem estragar a qualidade de vida

Para o director regional do Ambiente, Frederico Cardigos, só quando as pessoas começarem a retribuir os gastos ambientais provocados pelo consumo é que se dará a viragem na sociedade rumo a um Ambiente mais saudável e duradouro.

Cristina Silveira

Se quisermos que o planeta Terra possa perdurar para aqueles que nos sucederem, há que inverter uma série de atitudes, caso contrário o meio em que vivemos poderá tornar-se inabitável. Em entrevista ao Tribuna das Ilhas, o director regional do Ambiente, Frederico Cardigos, em funções há três meses, explica, na sua primeira entrevista, como se dará a viragem e que atitudes temos de inverter. Educação ambiental, agricultura biológica, gestão de lixos, áreas protegidas, erradicação de invasoras, Vigilantes da Natureza e projectos em curso para o Faial, são temas abordados por este governante que trouxe os conhecimentos de biólogo e a vontade de aprender mais para poder dar o seu contributo positivo ao desenvolvimento ambiental dos Açores.

Tribuna das Ilhas - O planeta Terra está colocado sob diferentes tipos de pressão que nos podem levar a pensar que as perspectivas são extraordinariamente negativas e mesmo sem retorno…

Frederico Cardigos – Não é bem assim. Mas de facto há uma responsabilidade enorme tanto por parte dos governos, porque são eles que devem orientar as macro-políticas, como ao nível dos cidadãos, em inverter a situação. Na atitude de cada um pode estar a diferença entre uma coisa e outra.

T.I. – Como se vai dar a viragem?

F.C. - O momento de viragem está relacionado com a integração no mercado dos valores ambientais que neste momento estão dispersos. Ou seja, quando estamos a utilizar um combustível, estamos a pagar pelo preço que custou prospectá-lo, extraí-lo, tratá-lo, transportá-lo, vendê-lo ao consumidor, mas o resto do valor, que são os gastos ambientais relacionados com tudo isso e principalmente com o próprio queimar do combustível, não é pago. Quando o mercado começar a integrar também esse valor, claro que as pessoas vão pagar muito mais e podem não estar a priori dispostas a isso. Mas no meu entender, esse é o ponto de viragem: quando as pessoas passam a pagar aquilo que realmente estão a consumir, não só em termos do produto em si mas daquilo que é a destruição do património colectivo.

T.I. – Quando isso acontecer, tudo será diferente?…

F.C. - Se as pessoas pagarem esse valor, é evidente que depois passam a ter outro tipo de atitudes e inverter-se-á o processo. Em vez das pessoas pagarem combustíveis fósseis, se calhar, vão pensar que era muito melhor terem painéis solares em casa ou aerogeradores, porque passa a ser compensador investir nas energias alternativas, que, em consequência vão ser muito mais baratas. Por enquanto, ninguém pensa nisso, porque não se paga o verdadeiro preço dos combustíveis fósseis.

T.I. – E quem sofre com isso é o ambiente…

F.C. - Os combustíveis fósseis são a origem das alterações climáticas, mas também estamos perante um cenário em que, dentro em breve, a quantidade de petróleo disponível vai ser menor e se os preços já estão tão elevados agora, imagine-se quando ele for mesmo escasso. É claro que a situação de desequilíbrio a nível mundial será muito grande, a menos que a situação seja invertida rapidamente. E inverter isso, na mina opinião, acaba por ser de solução simples, mas de aplicação hiper-complexa.

T.I. – Isso é algo que tem de ser implementado a nível mundial?

F.C. - Isto tem a ver com a macro-política mundial. Nesta altura temos de nos centrar noutros problemas, alguns dos quais estão relacionados com a internalização de valores económicos em que, geralmente, as pessoas não pensam. Por exemplo, ao nível dos lixos, neste momento estamos a pagar pelo processamento do lixo um valor que não tem nada a ver com aquele que ele custa na realidade. Isso está relacionado com todo o processo inerente aos três R’s. Primeiro, há Redução, depois Reutilização, nos casos em que isso é possível e, por último, Reciclagem. Provavelmente neste momento os municípios não querem entrar num processo de reciclagem completa em relação aos lixos por não disporem de verbas para tal, mas quando o consumidor tiver que pagar esse valor – e mais tarde ou mais cedo vai ter de o fazer – provavelmente os municípios terão uma abordagem completamente diferente. Mas aí também já compete ao Governo Regional dar o mote no sentido de indicar o caminho a seguir.

T.I.- Embora já haja pessoas que fazem coisas úteis pelo ambiente e tenham consciência de que os recursos não são inesgotáveis, a verdade é que na prática são uma minoria…

F.C. - Não sei se é uma minoria. A questão é que umas fazem mais e outras menos. Mas todas têm de fazer, e muito. As pessoas habituaram-se, ao longo dos últimos anos, a pensar que o sucesso se mede em automóveis, roupas caras, jóias, etc, quando o sucesso é as pessoas estarem integradas na sociedade e terem um comportamento ambiental positivo que permita às gerações futuras terem também um mundo confortável.

Educação ambiental também para adultos

T.I. – A agricultura biológica e a compostagem têm, ainda, pouca expressão entre nós?

F.C. - Não têm grande expressão nesta altura, mas já tiveram no passado. A utilização de composto faz parte dos usos tradicionais.

A produção agrícola é feita num sítio que não é compatível com aquele onde é consumida. Se pensarmos, a nível mundial, as zonas agrícolas estão bastante longe das urbanas. Depois de utilizados, é impossível em termos económicos que os resíduos resultantes do consumo voltem ao local de partida. Estamos numa lógica muito diferente em que, de facto, vão ter que se alterar imensos comportamentos para que tudo isto possa, depois, ser “cosido” de uma forma harmónica.

T.I. - Isso passará muito pela sensibilização que está a ser feita agora…

F.C. - Exactamente. Aí entra a grande componente chamada educação ambiental. Mas hoje em dia já passámos de uma fase em que a educação ambiental era pensada apenas para os mais jovens e estamos a entrar na fase em que é também para os adultos. Vamos, por isso, ter que actuar também no mundo dos adultos. São esses vão ter que mudar os seus comportamentos.

T.I. - O que é mais difícil porque já têm hábitos instalados…

F.C. - Sim, por um lado, mas por outro também ainda não se tentou. É mais fácil começar pelas crianças, mas não podemos é ficar por aí. Temos que chegar aos adultos. Como chegar lá é algo que vamos desenvolver nos próximos meses.

Agricultura biológica vai imperar

T.I. - A grande ‘indústria’ do futuro vai ser o Ambiente?

F.C. – Certamente que o mundo vai estar muito mais virado para actividades pró-ambiente. As pessoas já não pensam que é apenas uma actividade relacionada com o ambiente mas, sim, uma actividade económica como outra qualquer. No outro dia andei num daqueles carros que se movem a energia eléctrica e a combustível ao mesmo tempo, e não se nota a diferença. É absolutamente normal.

T.I. – Acha que a agricultura biológica não assume outras dimensões por causa dos seus custos elevados?

F.C. - Quando queremos ter produtos saborosos, optamos pela agricultura biológica, que já está implementada. Actualmente podemos pensar que os produtos são muito caros porque estamos a compará-los com os outros, que têm uma factura ambiental que neste momento não é paga. Usamos fertilizantes e pesticidas, que constituem a grande diferença entre a agricultura biológica e a outra, mas não estamos a pensar na degradação ambiental que é provocada por esses químicos e que, de facto, podem fazer uma grande diferença em termos económicos. Quando começarmos a pagar essa diferença, o contraste entre a agricultura biológica e a outra passa a ser esbatido.

Evoluir sem destruir o que temos

T.I. – Os Açores podem ser considerados, ainda, um oásis em termos ambientais?

F.C. - Os Açores são claramente um oásis em termos ambientais. Sempre foram e sempre serão. Em termos mundiais espero que, no futuro, os Açores não se evidenciem, e que todos consigam ter um ambiente suficientemente bom para que as pessoas se sintam bem onde estiverem. Mas, para já, é claro que os Açores têm de apostar nos contrastes que têm em relação ao resto. Este é o capital positivo dos Açores. É claro que temos problemas ambientais, mas temos a enorme vantagem de sabermos quais são e quais são as soluções. O nosso grande desafio é conseguir evoluir economicamente sem destruir esta qualidade de vida que está intimamente relacionada com o ambiente.

Gestão de lixos, Áreas Protegidas e erradicação de invasoras

T.I. – Como director regional do Ambiente, que projectos pensa desenvolver?

F.C. – Por gentil convite da Senhora Secretária Regional do Ambiente e do Mar, Dra. Ana Paula Marques, entrei no Governo a meio de um mandato e dentro de um programa de acção com o qual me solidarizo. Pretendo levar muito a sério os projectos que estão em desenvolvimento. E quero que eles tenham um resultado tão positivo quanto possível. Nesse aspecto há três coisas que eu gostava muito que tivessem um cunho positivo da minha parte: primeiro, a gestão de lixos nos Açores, e recordo que poucos dias antes de eu tomar posse – o que aconteceu a sete de Setembro deste ano - foi aprovado o Sistema Integrado de Gestão de Resíduos no arquipélago dos Açores (SIGRA), que pressupõe uma série de investimentos e uma estratégia a nível de todas as ilhas para fazer uma utilização adequada dos resíduos.

O segundo aspecto prende-se com o reordenamento das Áreas Protegidas, um projecto também já em curso. Está a ser feita uma reorganização das Áreas Protegidas de forma a permitir a criação de órgãos de gestão que funcionem ao nível da ilha e não ao nível da parcela do território classificado, o que vai fazer uma grande diferença.

O terceiro aspecto tem a ver com as espécies invasoras. Há uma série de plantas que não pertencem ao arquipélago dos Açores, pelo menos não naturalmente, que estão a invadir o espaço e a inibir as espécies endémicas ou indígenas. Quanto às indígenas, a situação não é má, mas no que diz respeito às endémicas, trata-se de um património único que se pode mesmo perder. E compete à Direcção Regional do Ambiente, e ao director em particular, evitar que isso aconteça. Um exemplo do que estou a dizer, é o Monte das Moças, que está cheio de canas e conteiras.

E agora existe uma trepadeira nova, lindíssima, chamada Hypomeia, que “abafa” o que está por baixo. É dramático. A Direcção Regional do Ambiente obviamente que tem de intensificar uma estratégia para inverter a situação! Provavelmente não conseguiremos erradicar essas espécies, mas vamos reduzir o seu número até a um ponto em que possam conviver com as outras, sem as ameaçar.

T.I. – Já que falámos em endémicas, a camarinha é um bom exemplo disso. A Azorica tem feito um grande esforço para que esta espécie não seja extinta no Faial.

F.C. – É verdade. O presidente da Azorica já falou comigo sobre esse assunto e apresentou uma proposta por escrito para que se pense na sua classificação. Alguns técnicos desta Direcção estão a estudar esse assunto, o que provavelmente será complementado com uma análise exterior à própria DRA.

Já agora refiro que, tal como um grupo de cidadãos do Corvo teve a iniciativa de proteger uma parte do seu património marinho, concretamente na zona do Caneiro dos Meros, em relação à camarinha fazia sentido que os cidadãos, em conjunto com a edilidade, decidissem voluntariamente que aquela endémica na Fajã possuirá uma reserva. Isso facilita depois a fiscalização. É preciso que as pessoas conheçam esta espécie endémica, a valorizem e se disponham a protegê-la.

“Câmaras gastam muito dinheiro com os lixos”

T.I. – O tratamento dos resíduos é uma dor de cabeça para as autarquias.

F.C. - Reconheço que existe um esforço por parte da Câmara Municipal da Horta, assim como acontece com os outros municípios, em resolver o problema dos lixos. E foi por isso que o Governo aprovou o SIGRA e estamos a passar do SIGRA ao PEGRA, ou seja, o SIGRA é o sistema, o PEGRA é o plano estratégico em que, a nível mais detalhado, estarão definidas as valências para serem implementadas em cada uma das ilhas dos Açores, no sentido de fazer com que o lixo deixe de ser um problema e passe a ser uma solução.

Centenas de coimas ambientais nos Açores

T.I. – As pessoas ainda têm muito a noção de que as ribeiras e as encostas são vazadouros de lixo.

F.C. – Isso já acontece com muito menor intensidade. É claro que os Vigilantes da Natureza e os outros agentes da autoridade têm instruções para, primeiro aconselhar e explicar o que está em causa e porque não devem proceder de determinada forma e, depois, autuar. E têm-no feito: existem centenas de coimas ambientais nos Açores, embora muita gente não tenha consciência disso.

Existe uma actuação forte, mas tem de ser intensificada.

Vigilantes da Natureza com mais condições

T.I. – Para poderem actuar, os Vigilantes da Natureza têm de ter condições. As suas reivindicações já foram atendidas?

F.C. - Felizmente estamos numa situação de mudança. Estão a ser feitos concursos para a admissão de novos Vigilantes e em relação ao equipamento, que legitimamente ambicionam, está prestes a chegar.

Projectos para o Faial

T.I. – Em que ponto se encontram os projectos ambientais para o Faial?

F.C. - O que considerámos prioritário foi o Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos, que está em execução. Vale a pena ir até lá e espreitar a parede do andar inferior que não via a luz do dia há cerca de 50 anos.

De Interpretação, que permitem às pessoas ficar a saber a história natural de cada lugar. Para além de verem a paisagem podem obter ajudas para a sua compreensão.

Relativamente a Porto Pim, há uma macro-obra que integras várias subunidades. Existe o bar, que está integrado nesse Plano, e que já se encontra em funcionamento, e estamos a aperfeiçoar os projectos que existem em relação à fábrica da baleia velha, que vai ser recuperada, para acolher ideias interessantes, que a seu tempo serão anunciadas. A Casa dos Dabney também vai ser recuperada, mas o seu conteúdo é ainda uma surpresa. Contrariamente ao que se tinha pensado inicialmente, já não vai ser transformada num restaurante, porque se os que existem não estão a conseguir sobreviver, não fazia sentido o Governo criar mais uma estrutura para competir com as que foram arduamente criadas pela iniciativa privada.

Refira-se que em todas as ilhas já foram ou estão a ser construídas estruturas interpretativas do ambiente.

Em relação às plantas invasoras, iremos implementar diversas estratégias para nos começarmos a libertar delas. Aliás, incentivaremos todas as iniciativas de ONGs que tenham esse objectivo e que sejam enquadradas por técnicos da DRA.

T.I. – E quanto aos trilhos?

F.C. – A Levada é uma prioridade e uma mais-valia em termos de utilização turística que não pode ser desprezada. Neste momento existe uma consciência de que os Açores têm de entrar numa lógica de desenvolvimento sustentável, que só é exequível se o turismo que vier para as nossas ilhas não for o chamado turismo de massas. Tem que ser um turismo que venha à procura de qualquer coisa bastante específica. E obviamente que tem de estar relacionada com ambiente, mas não com ambiente sol. E para utilizar esse tipo de ambiente tem de haver uma série de mais-valias a nível cultural e outras que têm a ver connosco. Nessa perspectiva, temos estado a tentar instalar Centros de Interpretação, Trilhos e Ecotecas em todas as ilhas. Quando um turista chega aos Açores, para além de usufruir do património, pode e deve compreender o que está subjacente a esse património. Devo referir que há componentes de utilização ambiental que neste momento já são quase autónomas em termos de funcionamento, como sejam o mergulho, os passeios de barco à vela, enquanto outras ainda não têm essa capacidade, e cá estamos nós para dar o primeiro empurrão. Obviamente que esta parte da relação ambiental enquanto ambiente turístico tem mais a ver com a Direcção Regional do Turismo, o que não significa que não haja parcerias para que se fortaleça numa lógica de complementaridade.

Campanha SOS Cagarro

T.I. – A Campanha SOS Cagarro é um bom exemplo do envolvimento dos cidadãos e que poderia ser seguida para outras causas.

F.C. - A Campanha SOS Cagarro é uma iniciativa que não nasceu nesta Secretaria mas, sim, na Universidade dos Açores, mais propriamente no Departamento de Oceanografia e Pescas, na Horta, pela vontade do Dr. Luís Monteiro, que na altura dirigia um projecto “Life” que pretendia, entre outras coisas, salvaguardar as espécies de aves marinhas que cruzavam os Açores. Esta campanha teve imenso sucesso e foi agarrada pela Secretaria do Ambiente tendo como objectivos essenciais a salvaguarda da própria espécie, dos animais em si, colocar numa situação favorável aqueles que caem nas estradas e tomar iniciativas de educação ambiental em relação à importância das aves nos Açores. Não só sobre os cagarros mas, também, as outras para as quais o arquipélago se reveste de particular importância, como sejam os garajaus, o painho, etc.

O SOS Cagarro é exemplar e desejamos que se alargue as outras temáticas.

Ser biólogo ajuda a ser director do Ambiente

T.I. – Sente que o trabalho que desenvolvia como biólogo no DOP o ajuda agora nas funções de director regional do Ambiente?

F.C. – Muitos aspectos estão relacionados com o trabalho que faço hoje em dia. Como biólogo, as minhas actividades estavam relacionadas com o ponto de vista prático e teórico do meio marinho. Agora, essas actividades simplesmente alargaram-se. Antes, o meu trabalho tinha um conteúdo muito mais científico. Aquilo que me era pedido era que elaborasse estudos desde a concepção até à execução que, de alguma forma, ajudassem a interpretar o meio marinho e que depois pudessem ser utilizáveis na salvaguarda desse ambiente.

T.I. – Acha que agora pode fazer mais pelo ambiente do que antes?

F.C. – Posso, com certeza, contribuir mais do que antes e espero que esse contributo seja positivo.

Gostaria de referir que a DRA tem imensas iniciativas quer directamente quer em conjunto com outras entidades, mas o factor chave do ambiente nos Açores e no mundo é a participação. Quando os cidadãos tiverem vontade de participar e passar das palavras à prática, as coisas vão ser muito mais simples.

As perspectivas para o Desenvolvimento Sustentável na Região Autónoma dos Açores consagram onze prioridades e a primeira é precisamente a prioridade às pessoas. As pessoas têm de demonstrar o que querem e procurar faze-lo activamente. Por parte da Administração, têm que estar criados os instrumentos para que possam avançar. Já agora, posso dizer que o último desses pontos é passar das palavras à acção.